Três poemas de Robert Frost

Pensar em Robert Frost no Brasil é, antes de qualquer outra coisa, pensar na ausência dos poemas de Robert Frost nas estantes das livrarias, mesmo porque a vasta obra desse importante nome da poesia estadunidense encontrou pouquíssimo lugar entre as edições em português, chegando aos leitores brasileiros apenas como mais um nome dentro de algumas antologias. Acredito eu que isso esteja relacionado a dois motivos principais: uma associação feita entre a figura de Frost e um discurso conservador (fortemente combatido no meio intelectual do Brasil) e também o desinteresse editorial por um escritor já distante de nosso tempo e que é muito pouco falado em terras brasileiras, diferente de seus conterrâneos Ezra Pound, Walt Whitman ou Emily Dickinson.

Da rápida pesquisa que fiz aqui na internet, descobri que, no Brasil, a única publicação em livro que contempla com maior compromisso a obra desse poeta é Poemas escolhidos de Robert Frost (1969), com tradução para o português de Marisa Murray. O trabalho de Murray é uma joia ante a dívida com Frost, mas traz, entre alguns acertos, problemas na tradução, sejam ligados à linguagem, ou mesmo à atmosfera construída pelos poemas tão particulares. De qualquer maneira, à parte Poemas escolhidos (que não foi reeditado desde 69), não existe publicação em livro que seja exclusiva do autor.

Ainda assim, existem trabalhos acadêmicos ligados à obra de Frost, e dedico atenção especial para a dissertação de Ana Cristina Gambarotto, defendida em 2016, na qual ela disponibiliza a tradução integral de A Boy’s Will (1913), primeiro livro do poeta norte-americano:

Depois desse rápido desabafo, longe de dar conta da tarefa árdua que é traduzir a obra completa de Frost, trago para você três poemas do autor, traduzidos para o português por pesquisadores diferentes. Os poemas Into my own, Stopping by woods on a snowy evening e Mending wall foram pinçados da obra do poeta, escolhidos apenas pelo gosto pessoal desse redator que vos escreve. De qualquer maneira, eles demonstram o rigor com que Frost desenvolveu sua obra, compondo versos de métrica exemplar e consonante com nomes importantes da literatura ocidental, a exemplo de Omar Khayyam. Também, com o terceiro dos poemas, já fica claro o domínio que o autor de North of Boston (1914) tem tanto da linguagem, como da liberdade métrica.

Espero que as palavras precisas do poeta ianque despertem em você a mesma curiosidade que despertaram em mim, a ponto de procurar novos poemas e, quem sabe, uma edição completa de tão belos versos.


Poemas de Robert Frost

INTO MY OWN
(Dentro de mim)

O meu desejo é que essa selva escura,
tão fixa que a brisa mal a mistura,
não fosse a mera máscara das trevas,
mas se estendesse até o fim das eras.

E no dia em que não me deterão,
fugirei furtivo na vastidão,
sem temer jamais encontrar clareira,
ou estrada onde a roda deita a areia.

Não vejo motivos para retornar,
ou para que os saudosos ao meu lugar
não me sigam, nem me alcancem a trilha
curiosos se inda os tenho em alta estima.

Eles não me encontrarão diferente –
só mais seguro do que trago em mente.

Tradução: Ana Cristina Gambarotto

STOPPING BY WOODS ON A SNOWY EVENING
(Parando na mata numa noite de neve)

O dono dessa mata que vejo,
acho que mora além, no vilarejo,
e não me verá aqui parado
na mata, olhando a neve em cortejo.

Meu cavalo acha estranho e inusitado
parar assim sem casa ao lado
entre o lago duro e o desterro
no meio do escuro mais fechado.

Ele balança o seu cincerro
e me pergunta se há algum erro.
Só se ouve o vento a zunir
E os flocos caindo num aterro.

A mata escura e fundo a me sorrir,
mas eu tenho promessas a cumprir,
e muitas milhas antes de dormir,
e muitas milhas antes de dormir.

Tradução: Marcus Vinicius de Freitas

MENDING WALL
(O Conserto do Muro)

Existe alguma coisa que detesta os muros,
Sob eles faz inchar a terra congelada,
Ao sol derrama as pedras superiores,
E rasga brechas em que dois passam de frente.
A obra dos caçadores é outra coisa:
Tenho seguido as suas pegadas, trabalhando
Onde não deixam pedra sobre pedra
Até espantarem o coelho de sua toca
Para o agrado dos cães sempre a latir. Tais brechas
A que me referi, ninguém viu serem feitas,
Nem ouviu serem feitas, mas na primavera
Eu as encontro lá, no tempo dos consertos.
Aviso meu vizinho lá detrás do monte,
E marcamos um dia para vistoriar
E levantar de novo o muro entre nós dois.
E vamos juntos, com o muro entre nós dois.
Cada um repõe o que rolou para seu lado.
Umas pedras são pães e outras parecem bolas,
E só por mágica as mantemos no lugar:
“Até que nos viremos, fiquem onde estão!”
Os dedos criam calos ao lidar com elas.
Com um de cada lado, isto não passa
De outro jogo ao ar livre. E nada mais talvez:
Desnecessário é o muro onde se encontra:
Além há um pinheiral e aqui há macieiras.
As macieiras, digo-lhe, não vão passar
E comer seus pinhões. Mas ele secamente
Responde: “Boas cercas fazem bons vizinhos”.
A primavera é a minha malvadeza, e penso
Ser capaz de enfiar-lhe ideias na cabeça:
“Mas por que fazem bons vizinhos? Não seria
Apenas onde há gado? E aqui não temos gado.
Antes de erguer um muro, sempre me pergunto
O que busco reter e o que busco deter
E a quem ofenderia, se não o fizesse.
Existe alguma coisa que detesta os muros,
E os quer ver arrasados!” Dir-lhe-ia que os “elfos”;
Mas não são elfos propriamente, e eu gostaria
Que ele mesmo o dissesse. E observo como traz
Firmemente uma pedra em cada mão, pelo alto,
Igual a um homem das cavernas bem armado.
Caminha pelas trevas, me parece,
Que não são as dos bosques ou das sombras de árvores,
E, sem nunca ir além do dito de seu pai,
Satisfeito de nele haver pensado tanto,
Repete: “Boas cercas fazem bons vizinhos”.

Tradução: Paulo Vizioli


Robert Lee Frost

Robert Frost foi um poeta estadunidense que influenciou gerações de escritores posteriores a ele, considerado, portanto, como um dos principais nomes do modernismo na poesia anglo-americana. Tem entre suas obras mais conceituadas A Boy’s Will (1913) e North of Boston (1914), reconhecidas pelo bom trato de temas ligados à natureza e aos elementos que a compõem e a percepção do mundo moderno pelos olhos de um sujeito lirico fragmentado – traços que o poeta preserva até mesmo em suas últimas publicações. Além de poesias, Frost também escreveu textos para teatro.

Além dos três poemas citados acima, nós também fizemos, aqui no Duras Letras, uma tradução e uma análise do poema “The Pasture”, de Robert Frost, poema esse que abre a coletânea de textos do seu segundo livro – North of Boston –, além de ter sido escolhido como epígrafe para a obra completa do autor, publicada em 1964.

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Este post tem um comentário

  1. Paulo Aguiar

    Prezado Gabriel, muito obrigado !

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