Caio Valério Catulo (c. 87-c. 54 a.C.) foi um poeta latino muito inventivo, apaixonado e de quem sabemos pouco. Dizem que nasceu em Verona e que viveu boa parte de sua vida em Roma, transitando entre personalidades importantes da política e da arte da época, em um período conturbado da história. Simultaneamente adolescente e maduro, Catulo amou a Clódia (sua Lésbia), uma mulher de família tradicional, com quem viveu encontros amorosos e a quem dedicou uma série de poemas de amor, mas também de escárnio, zombaria e de baixaria.
Como restaram apenas fragmentos da maior parte de seus antecessores e contemporâneos também poetas, alguns pesquisadores consideram que estes poemas escritos por Catulo para Lésbia e outros amores fazem parte da primeira obra consistente de poesia lírica latina – compõem o Liber Catulli (O livro de Catulo) –, que é uma possível antologia antiga, reunindo os poemas supostamente escritos pelo poeta de Verona.
Agora, fora toda essa lenga lenga histórica e contextual, para mim, Catulo é meu motivo latino, meu convite a conhecer sua língua (a da boca?) e uma de minhas paixões anacrônicas: é um poeta de meu cânone pessoal. Foi por esse motivo que decidi trazer um pequeno compilado com sete de seus poemas, especificamente aqueles em que o amor, às vezes debochado e violento, está em primeiro plano. As traduções são de João Angelo Oliva Neto, de sua versão integral da obra de Catulo: O livro de Catulo, publicado pela Edusp.
Espero que vocês aproveitem a leitura! ♥
5. Vamos viver, minha Lésbia, e amar, e aos rumores dos velhos mais severos, a todos, voz nem vez daremos. Sóis podem morrer ou renascer, mas nós quando breve morrer a nossa luz, perpétua noite dormiremos, só. Dá mil beijos, depois outros cem, dá muitos mil, depois outros sem fim, dá mais mil ainda e enfim mais cem – então quando beijos beijarmos (aos milhares!) vamos perder a conta, confundir, p’ra que infeliz nenhum possa invejar, se de tantos souber, tão longos beijos.
7. Perguntas, Lésbia, quantos beijos teus bastam p'ra mim, e quantos são demais. Quantos sejam os grãos de areia Líbica a jazer em Círene, em láser fértil, entre o templo de Júpiter ardente e de Bato vetusto o sacro túmulo; quantas estrelas dos homens testemunham (furtivos), tantos beijos tu beijares basta a Catulo, insano, e é demais. Assim os curiosos não consigam computar nem más línguas pôr quebranto.
87. Mulher alguma pode se dizer bastante amada quanto amada é por mim Lésbia. Em pacto algum jamais houve tanta confiança quanto a que em mim se viu em teu amor.
109. Minha Vida!, me dizes que este nosso amor será feliz aos dois, será eterno. Deuses grandes, fazei que prometa a verdade, que sincera e de coração o diga e que nos seja dado, a vida inteira, sempre este pacto viver de amor sagrado.
14b. Se acaso vós leitores sois das minhas inépcias e as mãos não vos repugnar ao tocar-nos, AFASTAI A SEVERIDADE POIS VERSOS VIRÃO MAIS PICANTES
⚠️ Os poemas abaixo possuem linguagem sexual e obscena ⚠️
15. A ti eu me confio e meus amores, Aurélio, e de pudor eu peço vênia pois se já desejaste algo em teu ânimo que mantivesses casto e inteirinho, preserves em pudor este menino, não digo das pessoas – delas nada temo a passar na praça aqui e ali com suas próprias coisas ocupadas. Minha paúra és tu, e é o teu pau, fatal aos bons, fatal aos maus meninos; por onde queiras, como queiras, leva-o, quando saíres, pronto para tudo. Só ele excluo, sim, pudicamente, pois se uma ideia má ou louca fúria te impelir, pérfido, a tamanho crime de contra ele investir, outro eu, então, ah!, infeliz e malfadado, pelos pés arrastado, por teu rabo aberto vão passar mugens e rábãos.
32. Peço minha, boa, doce Hipsitila, minhas delícias, meus encantos, pede que eu vá dormir a sesta junto a ti. E se pedires cuida disto: que outro não introduza entraves na portinha nem queiras tu sair por aí fora. Mas fica em casa e vai te preparando para umas nove contínuas trepadas. E se é que vais chamar-me, chama logo, que almoçado, deitado, e satisfeito, tanto a túnica eu furo quanto o manto.