Recentemente uma colega da Faculdade de Letras perguntou quais eram os livros que eu julgava os mais importantes para começar a construir uma biblioteca de teatro. Por esse motivo, montei uma pequena lista para ela, da qual destaquei 5 LIVROS DE TEATRO IMPERDÍVEIS que, na minha opinião, todo mundo precisa conhecer e ter em sua biblioteca particular de dramaturgias.
É claro que essas listas são sempre perigosas e incompletas, e costumam dizer mais sobre quem as fez do que propriamente do tema em si (seja teatro ou qualquer outro). Então, queria deixar claro o critério que usei para escolher os livros. Quando fui montar a lista, tentei escolher peças que costumam aparecer em disciplinas e cursos sobre teatro, que foram dados ou frequentados por mim ao longo da minha formação. O resultado obviamente não dá conta da diversidade do universo teatral, mas pode ser uma boa porta de entrada para quem quer começar a ler e estudar teatro.
Trilogia Tebana: Édipo Rei, Édipo em Colono e Antígona Hamlet: o príncipe da Dinamarca Esperando Godot Vestido de Noiva Auto da Compadecida
A lista que enviei para minha colega continha mais do que essas cinco obras que listei acima. Então vou disponibilizá-la aqui, para o caso de alguém se interessar pela lista completa.
Apesar de sempre nos parecer um pouco distante, a cultura japonesa certamente está presente no nosso imaginário, tendo um nicho enorme de conteúdos na internet e fora dela. Seja por conta dos mangás, dos animes, das light novels e mesmo da literatura em sentido mais restrito, as narrativas que tematizam a história do Japão (com samurais, ninjas, gueixas e os xogunatos) – mais conhecidas como ficções históricas japonesas – são bastante populares e conquistam o grande público.
Em uma busca rápida por livrarias online (em inglês e em japonês), essas ficções históricas aparecem aos montes e em vários formatos – em filmes, séries, animes, etc. –, principalmente na forma de livros. Porém, quando pesquisamos o gênero em livrarias brasileiras, é preciso se esforçar um pouco para encontrar os que foram traduzidos para o português.
Por esse motivo, fizemos uma pequena lista para você que se interessa pelo gênero, pela cultura e pela história do Japão, trazendo alguns exemplos de ficções históricas japonesas disponíveis no nosso idioma. Na lista, incluímos tanto romances escritos ou por escritores nascidos no país asiático, como por descendentes diretos e desgarrados, que vivem em outros países (como no caso de Kazuo Ishiguro). Além disso, tentamos trazer obras que fazem um panorama histórico, já que as ficções históricas não necessariamente se restringem ao Japão feudal.
Muitos fãs e leitores chegam até esta obra por conta de um célebre mangá inspirado nela: Vagabond, de Takehiko Inoue. Em linhas gerais, Musashi é um romance épico que ficcionaliza a vida e a história de Miyamoto Musashi, um dos mais renomados espadachins e um rōnin do Japão Feudal, tendo como foco principal as aventuras e experiências desse guerreiro após a Batalha de Sekigahara: a batalha da “Divisão dos Reinos”, em 1600.
Bando de pardais é um livro que tem como cenário o Japão da abertura política, isto é, o Japão do século XIX, que passava por uma intensa agitação depois de dois séculos com as fronteiras fechadas. O país recebe um grupo de missionários americanos que são o gatilho para virar a vida do personagem principal de cabeça para baixo: Genji – um jovem senhor de Akaoka e também um profeta – que tem uma visão mágica, na qual sua vida seria salva por um estrangeiro. Entre batalhas violentas e profundos conflitos culturais, a narrativa foca os dramas vividos por Genji, por sua companheira (uma gueixa) e por seu tio (um espadachim), que juntos do grupo de missionários vão até o castelo Bando de Pardais.
Ishiguro, para muitos, dispensa apresentações, porque foi ganhador do Nobel e amplamente publicado e divulgado no Brasil. Ainda assim, Um artista do mundo flutuante (Companhia das Letras, 2018) não está entre suas obras mais populares, ainda que seja uma ótima ficção histórica.
Diferente dos livros de Eiji Yoshikawa e de Takashi Matsuoka, este – que foi o segundo trabalho de Kazuo Ishiguro – tem como pano de fundo um Japão mais contemporâneo, do século XX. A narrativa é contada por Masuji Ono, um artista atormentado por seu passado recente, porque esteve diretamente envolvido com a extrema-direita japonesa, participando do movimento imperialista e criando propagandas para sua divulgação. Com o fim da Segunda Guerra Mundial, Ono se vê obrigado a assumir a responsabilidade pelas decisões que tomou durante o conflito internacional e que feriram profundamente seu país.
Este livro provavelmente não deveria estar nesta lista, porque, além de não ser especificamente uma ficção histórica, é uma obra da literatura brasileira contemporânea. Mesmo assim, vamos abrir essa leve exceção, pois é realmente um ótimo livro e que tem o Japão como cenário.
Mesclando os diários de viagem do famoso haicaísta Matsuo Bashô com a melancolia vivida por dois brasileiros – Haruki e Celina –, Rakushisha procura pensar o estrangeiro a partir de uma linguagem poética. A narrativa tem como fio condutor a fratura interna dos dois personagens centrais: Haruki, um desenhista que se vê obrigado a visitar o país pelo qual nunca se interessou, mas a que sempre esteve ligado por ser descendente direto de uma família japonesa radicada no Brasil, e, do outro lado, Celina, uma mulher enigmática e introspectiva que está tendo dificuldades para acertar as contas com o passado, e que de repente aceita o convite de um desconhecido para ir para o Japão.
H. G. Wells (Londres, 1866-1946) é até hoje um dos mais prodigiosos e conhecidos autores de ficção científica, tendo escrito clássicos como A guerra dos mundos, A ilha do doutor Moreau, O homem invisível e A máquina do tempo. Mas o que muita gente não sabe é que, entre as centenas de histórias mais ou menos famosas que Wells escreveu, há uma grande quantidade de contos extraordinários que, além da ficção científica, contemplam os gêneros da fantasia, do terror, da aventura e até do realismo (geralmente, contos muito cômicos ou filosóficos neste último caso).
Pensando nisso, elaboramos para vocês uma lista com a seleção dos meus 30 contos favoritos de Wells, mesclando entre esses diversos gêneros que a literatura do autor abarca. (Até agora, nenhuma coletânea incluiu a tradução de todos eles para o português em volume único, mas um passarinho me contou que vem coisa boa por aí! Aguardem. ♥)
Decidimos não dividir a lista por gênero porque muitos dos contos caberiam em mais de um enquadramento. Por exemplo, será que The Star ficaria melhor classificado como ficção científica ou terror cósmico? E My first aeroplane –“Alauda Magna”, aventura ou realismo? Do mesmo modo, muitos outros podem ser lidos e compreendidos por mais de um ponto de vista, já que não existe pureza na distinção dos gêneros literários. De um jeito ou de outro, temos certeza de que nessa seleção é possível encontrar contos para os mais diversos tipos de leitores.
Ah! Outro ponto importante: os contos não estão na ordem dos meus favoritos – preferi organizá-los por ordem cronológica, de acordo com o ano da primeira publicação (vocês sabem, é tão difícil escolher… rs). Alguns deles já foram traduzidos e podem ser encontrados à venda em sites e livrarias. Recomendamos a leitura do e-book de A porta no muro, lançado pela editora Wish no projeto Sociedade das Relíquias Literárias. O livro pode ser baixado gratuitamente clicando aqui. 📚🦊
Também vamos deixar no final desse post alguns links para compra de livros de H. G. Wells. Usando nosso link, você apoia o nosso trabalho sem pagar nem um centavo a mais por isso. 🤩
A lista completa dos 30 contos de H. G. Wells vocês conferem logo abaixo. Esperamos que gostem!
Ah, o Amor! Um dos temas mais explorados pela literatura e pelas outras artes – que vem nos acompanhando desde os tempos mais antigos, não deixando de alcançar também as inventivas ficções futuristas – sem jamais esgotar-se, contudo. No post de hoje, dedicado ao Dia dos Namorados, nós do Duras Letras separamos cinco poemas que trabalham o Amor, lhe dando cara e cabelo, nome e brilho, voz e silêncio. A seleção é composta apenas por poetas brasileiras e brasileiros, alguns do século XIX, outros do século XX. E sabemos, é claro, que muitas joias preciosas poderiam ter entrado nessa lista, sendo ela, como qualquer outra, incapaz de dar conta de uma temática tão vasta ou mesmo de apreender toda a chama do Amor, que devora os corações. De qualquer modo, esperamos que os poemas abaixo, se não servirem de chama, pelo menos despertem uma fagulha.
Poema sem título, de Álvares de Azevedo (1831-1852)
Pálida à luz da lâmpada sombria,
Sobre o leito de flores reclinada,
Como a lua por noite embalsamada,
Entre as nuvens do amor ela dormia!
Era a virgem do mar, na escuma fria
Pela maré das águas embalada!
Era um anjo entre nuvens d'alvorada
Que em sonhos se banhava e se esquecia!
Era a mais bela! Seio palpitando...
Negros olhos as pálpebras abrindo...
Formas nuas no leito resvalando...
Não te rias de mim, meu anjo lindo!
Por ti - as noites eu velei chorando,
Por ti - nos sonhos morrerei sorrindo!
Poema Os cisnes, de Júlio Salusse (1878-1948)
A vida, manso lago azul algumas
vezes, algumas vezes mar fremente,
tem sido para nós constantemente
um lago azul sem ondas, sem espumas.
Sobre ele, quando, desfazendo as brumas
matinais, rompe um sol vermelho e quente,
nós dois vagamos indolentemente,
como dois cisnes de alvacentas plumas.
Um dia um cisne morrerá, por certo:
quando chegar esse momento incerto,
no lago, onde talvez a água se tisne,
que o cisne vivo, cheio de saudade,
nunca mais cante, nem sozinho nade,
nem nade nunca ao lado de outro cisne!
Poema V, de Hilda Hilst (1930-2004)
Aos amantes é lícito a voz desvanecida.
Quando acordares, um só murmúrio sobre o teu ouvido:
Ama-me. Alguém dentro de mim dirá: não é tempo, senhora,
Recolhe tuas papoulas, teus narcisos. Não vês
Que sobre o muro dos mortos a garganta do mundo
Ronda escurecida?
Não é tempo, senhora. Ave, moinho e vento
Num vórtice de sombra. Podes cantar de amor
Quando tudo anoitece? Antes lamenta
Essa teia de seda que a garganta tece.
Ama-me. Desvaneço e suplico. Aos amantes é lícito
Vertigens e pedidos. E é tão grande a minha fome
Tão intenso meu canto, tão flamante meu preclaro tecido
Que o mundo inteiro, amor, há de cantar comigo.
Poema Eros II, de Orides Fontela (1940-1998)
O amor não
vê
o amor não
ouve
o amor não
age
o amor
não.
Poema Escritura, de Armando Freitas Filho (1940- )
No escuro eu não apuro
o que de você existe entrelaçado
neste muro: no escuro o que procuro
é a cruz do seu corpo, a cicatriz,
o punho, a palma no instante
da abertura, o espaço tão vazio
onde situo, a perda, a rutura,
a veia degolada, e gota a gota
o inútil rumo do meu sangue:
– um derrame de ramos feito de sussurros –
e esta ferida que não cessa,
e que tanto me custa descrevê-la,
e quanto mais eu grito, mais ela fura:
– sanha, descostura de mim, – amor,
eu sangro aqui, sob a lâmina
da sua fala, assim, punhal,
palavra que não seguro e se enterra
até o fundo, até o cabo, em toda a treva,
e na esplanada de areia da memória
o que escrevo é somente um risco,
um corte que a lembrança recorda,
ou este acorde que suas garras tocam.
Oiê! Na lista de hoje, elencamos oito romances (e uma surpresa!) para quem quer começar a se aventurar pelos mares da ficção científica. A lista inclui desde textos muito antigos e canonizados a outros menos conhecidos, mas que têm conquistado seu lugar entre os destaques do gênero! Além desses, muitos outros seriam dignos de entrar numa lista dos melhores ou mais importantes – e é também por isso que não vamos colocar os romances indicados nesse tipo de competição: afinal, tem espaço pra todo mundo, não é mesmo?
Ainda assim, os romances escolhidos foram selecionados a dedo por uma aca-fan que tem buscado conhecer mais desse imenso universo literário! Vamos embarcar nessa com a gente? 😃
1. Frankenstein, de Mary Shelley (1818)
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O clássico de Mary Shelley foi considerado por Brian Aldiss o primeiro romance de ficção científica já escrito. 😮 E nós também achamos que ele merece a honraria! Afinal de contas, o célebre romance de Shelley mistura elementos da literatura gótica e de horror com extrapolações dos avanços científicos no campo da biologia e da medicina. Brincando de deus, Frankenstein criou um monstro – um que vive no mundo, e um que habita dentro de si. Mas qual dos dois será mesmo o pior? 🧠🦴🧟
2. Viagem ao Centro da Terra, de Júlio Verne (1864)
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Outro autor que merece destaque no campo da ficção científica é Júlio Verne, que escreveu, dentre tantas histórias, Vinte mil léguas submarinas, A volta ao mundo em 80 dias, A ilha misteriosa e Viagem ao centro da Terra, que escolhemos para entrar nessa lista. Apesar de ser considerado um dos pais do gênero ficção científica, os livros de Júlio Verne costumam aparecer mais ligados às histórias de aventura – como se um um livro de sci-fi não pudesse ser ao mesmo tempo uma aventura! Em Viagem ao centro da Terra, um cientista e seu sobrinho, acompanhados de um guia islandês, conseguem descer pelo interior da crosta terrestre, e lá encontram todo um mundo desconhecido, que contém desde dinossauros e homens das cavernas aos mais estranhos animais imaginários! Com certeza, é um dos livros que não poderia passar batido! 💛
3. A Guerra dos Mundos, de H. G. Wells (1898)
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Outro clássico indispensável na lista dos romances de ficção científica é A guerra dos mundos, de H. G. Wells – outro nome incontornável do gênero! Inventor de diversos temas que se tornaram convenções na escrita do sci-fi, em A guerra dos mundos, Wells nos apresenta uma invasão marciana narrada em primeira pessoa por uma de suas testemunhas. Nesse contexto, o poder bélico dos alienígenas é tão superior ao dos seres humanos que pouco resta à nossa pobre espécie senão se resignar ao massacre. Mas nem tudo está perdido! E a narrativa de Wells mostra como acontece de os seres mais subestimados se tornarem os heróis da vez.
🤑 Você pode adquirir gratuitamente o e-book do conto A porta no muro, também de Wells, em sua edição Kindle pela editora Wish.
4. Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley (1932)
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No mais conhecido livro de Huxley, entramos em contato com a primeira distopia da lista! – Sim, distopias também são ficção científica! Nesse mundo, os bebês são criados em laboratório e condicionados – química e psicologicamente – a agir de acordo com suas castas: alfas e betas ganham os melhores cargos e luxos, enquanto deltas e gamas vivem mecanicamente suas vidas de exploração, e todos são viciados em soma, uma droga para aliviar o vazio dessa vida medonha! Mas tudo começa a dar errado quando Bernard, o protagonista, começa a questionar a superficialidade da sua existência, almejando mais, ainda que permaneça guiado por princípios fúteis. Ao fazer uma viagem a uma “reserva”, onde vivem os povos que não foram atingidos por essa civilização, Bernard e a moça que está tentando impressionar conhecem John, o selvagem, que volta com eles para o mundo moderno. A partir desse ponto, é só confusão atrás de confusão – e garanto que, pelo desenrolar da história, Huxley não parecia nada otimista quanto ao futuro que imaginou! 🚁
5. Blade Runner: Androides Sonham com Ovelhas Elétricas?, de Philip K. Dick (1968)
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Nessa narrativa, acompanhamos um caçador de androides, que trabalha “aposentando” (um eufemismo para matando) um grupo específico de andys, que teria fugido da colônia em Marte para viver livremente na Terra. Alternadamente, assistimos à vida mais monótona, e mais sensível, de Isidore, um “cabeça de galinha”, afetado pela poeira radioativa que atingiu todo o planeta. O livro aborda diversos temas da maior importância, como a religião e a nossa relação com os animais, mas sem dúvidas o tema que mais chama a atenção é a dificuldade da distinção entre os que são e os que não são humanos, pois nesse mundo os androides fugitivos são praticamente idênticos a nós. Para distingui-los, o caçador Deckard aplica um teste de empatia e no contexto do livro, é o resultado desse teste o que justifica o assassinato a sangue frio e a absurda desumanização dos androides. Por essas e outras, as questões que Blade Runner levanta continuam mais que atuais – e a leitura, por si mesma, é muito envolvente.
6. A Mão Esquerda da Escuridão, de Ursula K. Le Guin (1969)
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No romance de Le Guin, o embaixador Genly Ai visita o planeta Gethen para convencer seus líderes a se unir à Liga de Todos os Mundos (algo como a ONU, ou parecido). Mas Genly se depara com entraves de um tipo inesperado: o fato de os gethenianos não possuírem as nossas formas de gênero – não sendo nem homens, nem mulheres. Além de discutir os papeis de gênero, A mão esquerda da escuridão também proporciona reflexões muito válidas sobre a amizade, a lealdade e as dinâmicas da vida política, e isso tudo sem falar na incrível aventura no gelo que se passa por volta da segunda metade do livro!
Vale lembrar que esse romance é considerado um dos pioneiros no subgênero de ficção científica feminista, que também conta com grandes nomes como os de Joanna Russ (The female man) e Angela Carter (A paixão da nova Eva). 💋💪
7. Matadouro Cinco, de Kurt Vonnegut (1969)
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O romance de Vonnegut é instigante por várias razões: além de ser fragmentado e pós-moderno, ele apresenta uma narrativa muito próxima à vida pessoal do escritor, um dos sobreviventes ao bombardeio na cidade alemã de Dresden, durante a Segunda Guerra Mundial. No livro, o personagem central viaja no tempo – e no espaço – entre seu futuro como um optometrista casado e com filhos, que leva uma vida relativamente tranquila, e os momentos do passado, em que era ainda um jovem soldado tentando sobreviver à dura realidade como prisioneiro de guerra. Além disso, o personagem também conta de suas viagens ao planeta Tralfamadore, para onde teria sido sequestrado para servir de reality show aos tralfamadorianos.
O livro deixa livre a interpretação quanto à questão das viagens no tempo – se seriam, de fato, viagens reais ou viagens na memória. Independentemente disso, é uma obra que vale a leitura, sendo um dos bons exemplos de como a ficção científica também pode servir a repensar os traumas da nossa história.
8. Kindred:Laços de Sangue, de Octavia E. Butler (1979)
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No romance Kindred – Laços de família você vai acompanhar a história de Dana, uma jovem escritora afro-americana, que de repente viaja para o tempo de seu tataravô, Rufus: um menino branco e filho único de uma família latifundiária do sul dos Estados Unidos. Só que o salto temporal de Dana é um mistério que o livro de Butler não soluciona: não há qualquer sugestão de tecnologias, sofisticadas ou não, que sejam capazes de romper a barreira do tempo – uma das razões porque, vez por outra, aparece a dúvida quanto ao enquadramento do romance na categoria de ficção científica, o que pesa ainda mais por ser uma narrativa muito próxima à história e às questões pós-coloniais.
Agora, um detalhe interessante e que corrobora a ideia de se tratar de uma ficção científica é a posição de Dana em relação à maior parte das personagens da trama. Pelo fato de o período histórico para o qual ela foi transportada ser antes da guerra civil americana, Dana se vê como uma espécie de alienígena: incapaz de se comunicar e agir da forma que conhece e sendo sempre vista com desconfiança, como uma “pessoa fora do lugar”. 👽 E aí, o que você acha?
Bônus:A Verdadeira História da Ficção Científica, de Adam Roberts (2018)
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Se você se interessou pelo gênero e gostaria de ler mais sobre suas questões históricas e teóricas, uma ótima recomendação é o livro A verdadeira história da ficção científica, de Adam Roberts!
Nele, o autor apresenta algumas das muitas definições de sci-fi e o desenvolvimento histórico do gênero, passando pelas suas origens entre os séculos XVI e XIX, as revistas pulp e os sucessos nas telas de cinema.
O livro é dividido em 16 capítulos, sendo que o último é sobre a ficção científica do século XXI. A primeira publicação do livro, em inglês, foi feita em 2005, mas foi em 2018 que chegou para o público brasileiro pela editora Seoman.
O que achou da nossa lista? E o que mais você acha que deveria aparecer por aqui? Conta pra gente! Vamos adorar te ouvir ♥
Aposto que, quando abriu este post, você já foi logo se adiantando:
– Devem ter colocado Dom Casmurro, Grande Sertão:veredas, Vidas Secas, Fogo morto, Um copo de cólera, Dois irmãos ou, sei lá, Iracema.
É claro que essas obras, graças ao fantástico domínio da linguagem, pela extrema importância e diálogo com nossa história e também por conta das narrativas apaixonantes que nos apresentam, frequentemente recebem lugar de destaque em qualquer lista de clássicos da literatura nacional e, de vez em quando, até internacional.
Contudo, se você veio apenas para confirmar suas suspeitas, procurando essa boa e velha lista de livros canônicos, não vai encontrá-la por aqui!
Na verdade, os livros que compõem a listagem que montamos a seguir também estão entre as GRANDES obras da literatura brasileira, tão brilhantes quanto as que foram supracitadas. Só que, diferente daquelas, essas outras guardam dois traços que as diferenciam: o primeiro é que não aparecerem com frequência em catálogos de indicação literária; em segundo lugar, são todas obras escritas por ESCRITORAS, características que tornam essa lista duas vezes mais instigante.
Vamos conferir?!
1) Úrsula, de Maria Firmina dos Reis
Começamos por Úrsula, de Maria Firmina dos Reis, obra que conta a história de uma jovem que dá nome ao livro e que deseja viver livremente uma aventura de amor com Tancredo. Mas, ligados à uma sociedade marcada pelo atraso da escravidão e do patriarco, eles são impedidos de realizar essa união.
Pouco vale este romance, porque escrito por uma mulher, e mulher brasileira, de educação acanhada e sem o trato e conversação dos homens ilustrados.
Colocada à margem da literatura nacional de seu tempo por ser mulher e por ser negra, Maria Firmina dos Reis demonstra um grande interesse pelas questões ligadas à sociedade colonial brasileira, utilizando-se da forma literária para desconstruir os paradigmas de sua época, sustentada por uma estrutura falida, de uma realidade em constante, mas lenta, transformação.
É impressionante saber também como os problemas confrontados pela autora não se restringem apenas ao ambiente em que se passam suas história: alguns estudos demonstram que, por não estar alinhada com a temática nacionalista dos romantistas contemporâneos à ela, Maria Firmina foi constantemente silenciada, ficando a cargo de estudos mais recentes recolocá-la em sua merecida cadeira dentro do cânone nacional.
2) Parque Industrial, de Patrícia Galvão (Pagu)
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O segundo romance foi publicado por intermédio de Oswald de Andrade e sob o pseudônimo de Maria Lobo: Parque Industrial, de Pagu, tido como um dos primeiros romances proletários do Brasil. Nele, a autora reflete a condição dos operários da nova sociedade industrial paulista, das décadas de 1920 e 1930, colocando no centro do debate temas ligados ao amor, ao sexo e ao capital, e como os desejos das personagens são afetados pela realidade industrial precária.
Diferente da tradição corrente de sua época, que debatia principalmente os regionalismos brasileiros (com a aparição das principais obras de Graciliano Ramos, Rachel de Queiroz, Jorge Amado e outros), Pagu preservou bastante da veia modernista paulista e manteve a capital financeira do Brasil no centro da discussão literária e social nacional.
É uma leitura bem fluida que reafirma a importância do debate sobre classes sociais no Brasil, isso sem deixar de lado o estilo autêntico e forte da escritora paulista.
3) Água funda, de Ruth Guimarães
A gente passa nesta vida como canoa em água funda. Passa. A água bole um pouco. E depois não fica mais nada.
Agora, vamos para o primeiro romance de Ruth Guimarães, publicado no mesmo ano de Sagarana, de Guimarães Rosa, 1949. Diferente da obra do autor mineiro, Água funda não traz um léxico inventado a partir da plasticidade do falar interiorano; na verdade, Ruth faz uma reconstrução etnográfica minuciosa da língua portuguesa falada na região em que se passa a história: no sul de Minas Gerais, na fazenda Olhos D’água.
Em uma narrativa que embaralha o tempo e as personagens, indo do período escravocrata até os anos 1930, o leitor percorre a história de Mãe de Ouro, Sinhá, Joca e outros personagens, todos eles marcados por discursos marginalizados pela História, como narrativas tradicionais, ditados e superstições populares.
4) Ciranda de Pedra, de Lygia Fagundes Telles
Esta obra de Lygia Fagundes Telles é um pouco mais conhecida que suas antecessoras. Teve duas adaptações para a televisão, feitas pela Rede Globo, a primeira de 1981 e a segunda de 2018. É um dos livros mais emblemáticos e conhecidos de Lygia Fagundes Telles, no qual a autora explora temas sensíveis, em uma sociedade patriarcal e preconceituosa em vários sentidos.
No livro, o leitor acompanha duas facetas de Virgínia: a primeira, a de uma criança de infância difícil, de pais separados, e que não consegue se encaixar no grupo dos seus amigos Letícia, Afonso, Conrado, Otávia e Bruna, que, como os anões no jardim da casa de Natércio, não deixam espaço para que ela entre na roda, na ciranda. A segunda face é de uma Virgínia adulta e amadurecida, que, após passar por um colégio de freiras, retorna para a casa de Natércio e começa a descobrir que todo aquele mundo completo que não deixava espaço para ela tem lá seus graves problemas e contradições.
5) Quarto de Despejo, de Maria Carolina de Jesus
Quarto de Despejo é o típico livro que dispensa apresentações, pois possui uma circulação e influência no universo literário brasileiro que o coloca ao lado de clássicos como o Dom Casmurro, de Machado de Assis. O livro de Maria Carolina de Jesus é um reprodução de seus diários, em que são narrados eventos de uma odisseia cotidiana das comunidades pobres de São Paulo, de maneira crua e precisa.
O relato, habitado pela relação entre o ficcional e o concreto, nos apresenta as angústias de uma vida marcada pela dor, pela fome e pelas transformações agressivas feitas nas favelas naquele momento. Além disso, o estilo diarístico e confessional de Carolina de Jesus fez o livro flutuar entre as mais diversas categorias literárias: indo da literatura de testemunho até a literatura das vozes subalternizadas.
6) Rakushisha, de Adriana Lisboa
Para terminar, elenco aqui um romance contemporâneo, escrito por Adriana Lisboa – autora que vem ganhando cada vez mais destaque na cena literária nacional e que se nos apresenta como uma leitora atenta das tradições literárias nacionais e internacionais – uma forte candidata ao cânone brasileiro.
Em Rakushisha, observamos o desenrolar da história de Haruki, desenhista carioca e descendente de japoneses, que, ao ser convidado por sua ex-parceira para ilustrar um livro de poemas do haicaista Matsuo Bashô, se vê obrigado a visitar o país pelo qual nunca se interessou, mas a que sempre esteve ligado: o Japão. Mas, talvez receoso em seguir sozinho nessa viagem, ele convidou subitamente a estranha Celina para acompanhá-lo, depois de se encontrarem pela primeira vez em um metrô qualquer, de um dia como qualquer outro.
A autora a partir disso nos conduz através da jornada dos dois personagens em terra estrangeira, recheando a narrativa com uma linguagem de lirismo agudo e preciso, na qual as vozes se embaralham e variam entre os protagonistas, que contracenam inclusive com o próprio poeta japonês Bashô.
Nesta noite ninguém pode deitar-se: lua cheia.
A presença desse livro nessa lista é também uma provocação, sendo ele um livro do novo milênio, ainda não entendido pela crítica como clássico da literatura brasileira. De toda forma, sua narrativa e linguagem tocam questões que sempre estiveram presentes em nosso universo literário, como a identidade nacional e o que a constitui; além disso, ele nos ajuda a entender questões de nosso próprio tempo – a solidão, a perda, a depressão –, sem deixar de lado uma qualidade própria aos clássicos da literatura.
Miso no oto
Com isso, terminamos nossa pequena lista, sabendo, é claro, que muitas autoras maravilhosas, também canônicas, ficaram de fora. Poderíamos acrescentar, por exemplo, Clarice Lispector, Conceição Evaristo, Hilda Hilst, Maria Valéria Rezende, Ana Maria Gonçalves… nomes que não apareceram, mas que facilmente poderiam ser colocadas. Quem você acha que faltou?
Perdoadas as faltas, esperamos que a intenção principal deste post tenha se cumprido: conseguimos cutucar um pouco essa tradição tão difundida, de colocar apenas os escritores, e frequentemente os mesmos, nas listas de grandes romances da literatura brasileira?
Olá! E bem-vindos ao primeiro post do Duras Letras em 2021! Para abrir o ano com chave de ouro, especialmente de um 2020 tão surreal como todos sabemos que foi, proponho aos queridos leitores uma breve lista de 5 contos de ficção científica escolhidos a pente fino – só a nata da nata!
E se você ainda tem dúvidas se o gênero ficção científica é para você, saiba que essas são algumas das melhores histórias para tirar a prova, selecionadas a dedo para impressionar até os leitores mais exigentes! Vamos lá?
1. “Razão” (1941), de Isaac Asimov
O primeiro conto da lista é Razão (do livro “Eu, robô”), do consagrado Isaac Asimov, em que acompanhamos a tentativa de um androide de compreender sua própria origem e propósito. Recém-construído por dois humanos numa estação espacial, o robô não acredita que seres cuja inteligência fosse tão menor que a dele próprio pudessem tê-lo criado, a despeito das inúmeras evidências que seus criadores apresentam para convencê-lo do contrário.
O conto é instigante por levantar reflexões sobre a relação entre criador e criatura, aí inserido o debate sobre o criacionismo e a fundação das religiões. Asimov também nos faz encarar, não sem dificuldades, a complexa situação dos postulados lógicos, que – no limite – se aproximariam muito das questões de fé. A pergunta final que o conto suscita é: como saber o que é real?
Para os amantes do ceticismo e questionadores de carteirinha, é uma ótima pedida! Se é o seu caso, clique aqui ou no botão abaixo para ler o conto completo.
O segundo conto da nossa lista é Vocês, zumbis… (“All you zombies“), que talvez conheçam por meio da adaptação cinematográfica Predestinado (Predestination). Nele, seguimos de perto o relato de Jane, um homem que, tendo nascido com os dois sexos, passou a maior parte da juventude como mulher e, após ter tido uma filha, foi transformado cirurgicamente para manter apenas os caracteres sexuais masculinos.
Ainda na maternidade, contudo, sua filha é sequestrada, e Jane, que nunca desistiu de encontrá-la, segue sua vida sem muito entusiasmo. Enquanto conta sua história para o barman com quem conversa, este revela, misteriosamente, já conhecer muitos detalhes da sua vida, e apresenta a solução para finalmente encontrar a filha, depois de muitos anos – a solução que, no fim das contas, está na origem do próprio problema, com direito a descobertas bombásticas.
Gostou? Clique aqui ou no botão abaixo para ler o conto traduzido.
O terceiro conto, “A gaiola de areia” (The cage of sand), de J. G. Ballard, presente no livro As vozes do tempo, apresenta uma perspectiva existencialista sobre os sonhos da conquista espacial.
Acompanhamos de perto a vida de Bridgeman numa Cabo Canaveral aterrada de areia marciana, onde, além dele, vivem apenas dois outros personagens: Travis, um ex-astronauta com problemas de consciência, e Louise, uma viúva cujo marido morreu no espaço. Ao longo do conto, descobrimos que os três personagens têm relação próxima com a atividade espacial, e vivem como fugitivos numa terra desertificada e contaminada. À noite, eles assistem juntos à “conjunção”, isto é, o momento em que as cápsulas de astronautas que morreram em serviço atravessam o céu como estrelas cadentes – mas também como caixões em perpétuo movimento.
Mais que pelo desenrolar do enredo, o conto nos toca por falar de questões próprias a toda a humanidade, como a solidão, a relação com a morte e o desafio de seguir em frente. Além disso, Ballard é um mestre da escrita, e suas descrições são tão vívidas e impactantes que só por elas a leitura já valeria a pena.
4. “Podemos recordar por você, por um preço razoável” (1966), de Philip K. Dick
(“We can remember it for you wholesale”, 1966)
O conto Podemos recordar por você, por um preço razoável (“We can remember it for you wholesale”), de Philip K. Dick – autor do clássico Blade Runner e outras obras de sucesso –, conta a história de Douglas Quail, um homem cujo sonho sempre foi conhecer Marte. Sendo um incompreendido e frustrado, ele recorre a uma empresa de implantação de falsas memórias para realizar esse desejo, porém, durante o procedimento, descobre-se que essa memória já estava em sua mente. A partir daí, a história se torna cada vez mais próxima de um suspense/thriller, em que seguimos junto a Quail na tentativa de saber o que de fato aconteceu e como ele está envolvido nessa história. Para quem curte narrativas com muita ação, surpresas e reviravoltas, a história de Dick é imperdível.
O conto faz parte da coletânea “Minority Report – A Nova Lei”, e foi adaptado para o cinema no filme “O vingador do futuro” (“Total Recall”), que ganhou uma nova versão cinematográfica em 2012. Outro filme que trabalha a questão da implantação (ou, no caso, remoção) de memórias e que vale a pena conferir é “Brilho eterno de uma mente sem lembranças”, do impecável Charlie Kaufman.
5. “Superbrinquedos duram o verão todo” (1969), de Brian Aldiss
(“Supertoys last all summer long“, 1969)
Chegamos ao último conto da nossa lista: Superbrinquedos duram o verão todo (“Supertoys last all summer long“), de Brian Aldiss, publicado no livro de mesmo título.
O conto apresenta a perspectiva de David, um menino robô cujas capacidades para amar, interagir e compreender o mundo são como as de um menino humano. Contudo, David não é amado, e embora se esforce para expressar seu afeto à mãe, Monica Swinton, ela não retribui seus sentimentos e não consegue se conectar com ele, de modo que os dois sentem a presença pesada da solidão e da incompreensão, e o único que de fato se aproxima de David é Teddy, um robô ursinho que lhe faz companhia – e que também é rejeitado pela “mãe”. Ao final do conto, o senhor e a senhora Swinton celebram o fato de finalmente terem recebido a autorização do governo para ter um filho, e paira a dúvida sobre o que será feito de David e Teddy.
O conto é singular por sua capacidade de nos levar a pensar sobre a natureza do amor, as condições de um ser para se conectar a outro e as formas nocivas com que muitas vezes tentamos preenchemos o vazio e a infelicidade de nossas vidas, sem nos atentar para como isso pode causar sofrimento a outros seres. Afinal, quem é mesmo capaz de amar? Também este conto foi levado às telas do cinema na adaptação “A.I. – Inteligência Artificial”, do diretor Steven Spielberg, uma versão que certamente vale a pena conferir.
Para finalizar…
Essa seleção foi pensada com carinho especialmente para as pessoas que têm curiosidade com ficção científica, mas pouca disposição para quebrar a cabeça tentando achar sozinhas aquilo que vale à pena. Não quer dizer que sejam as únicas: na verdade, existem muitas outras histórias legais por aí, esperando apenas ser encontradas. Espero que esse post tenha ajudado a entender que ficção científica não é só sobre robôs, astronautas, marcianos e raios-laser, mas sobre a nossa realidade, identidade e questões fundamentais, ficcionalizadas em outros universos possíveis. E aí, qual você vai ler primeiro?